sábado, 21 de fevereiro de 2009

Carnaval/Cartas II/Resposta




Resposta de Raulzito

Para: Bernardo Biagioni (Carnaval/Carta II)


Ufa! Achei que você tinha perdido a cabeça. Já estava pronto para chegar em sua casa batendo a porta e gritando “Tá louco meu irmão?!?!?”. Seria engraçado se o Eustáquio estivesse no sofá nesse momento. Ele não entenderia nada.


Perdoe a minha falta de sensibilidade, responsabilizando você por toda a futura anarquia que esses dois vão causar, mas tenho motivos para isso. Não é a primeira vez que viajo com eles. Há alguns verões atrás, naquela época em que as coisas não andavam nada boas por aqui – Nelson Gonçlaves havia morrido e nos passamos a tomar de três a quatro garrafas de rum por dia, relembrando como Lulu Santos costumava ser O CARA – um pouco antes de você sumir, para ser encontrado só dois anos depois, vivendo com aquela trupe de tanguistas circenses em Stalingrado, eles me raptaram. Não me lembro de quase nada, agiram como profissionais. Só sei que em uma manhã tão bonita quanto à manhã de Sweet Virginia dos Rolling Stones, enquanto eu regava o jardim e dançava bolero com a minha nêga, os dois, vestidos de piratas e completamente chapados, apareceram do nada – como ninjas fazem – e me capturaram. Fiquei sem reação! Imagine se piratas bêbados, agindo como ninjas, surgissem de repente na sua frente? Completamente apavorante, isso eu posso dizer.


No meio do caminho para a Bahia, tive a oportunidade de saltar do carro e fugir. Mas pensei “Foda-se, estou nisso até o fim”. A essa altura, eu já estava bem doidão e tinha parado de suar. A minha comunicação com os dois começava a melhorar. Chegaram até a me dar uns bolinhos deliciosos.


Rodeado de vários litros de bebida alcoólica e de dezenas de pílulas de cores diferentes, abri um sorriso, pensando estar preparado para todo o tipo de experiência que estava a minha espera, por mais extravagantes que fossem. Bem, eu estava enganado...


O grande problema desses rapazes era o nacionalismo exacerbado. Particularmente, não tenho nada contra isso, porém quando se encontravam no ponto mais alto das alucinações, passavam dias vestidos apenas com a bandeira do nosso país, obrigavam-me a tocar corneta por horas e saiam assustando as velhinhas da região, dizendo que eram Café Filho e participavam de uma tal sociedade alternativa. Muitas das idosas não sobrevivem a esse choque.


O que fez com que eu não perdesse o juízo por completo nessa aventura foi o samba. Mais precisamente, um maravilhoso álbum que trazia a divina Elizeth Cardoso, acompanhada pelo Zimbo Trio e por Jacob do Bandolim. Estive pensando, um músico, para chegar ao ponto de receber o nome do instrumento que toca, tem que entender bastante do que faz. E o Mestre Jacob entendia. Com seu bandolim, ele conseguia englobar as músicas em uma atmosfera mágica, tornando-as quase algo de outro mundo. Considerando o repertório – cheio de Vinicius e Tom, Pixinguinha, Roberto Menescal, Noeal Rosa – cantado por uma das mais memoráveis vozes já existentes na música, você deve entender bem, o quão maravilhoso é a experiência de ouvir esse clássico. De samba conheço pouco, mas para mim, sem dúvida alguma, essa é a melhor gravação existente do gênero.


Espero que tenha entendido a profundidade da enrascada em nos meteu. Agora não tem mais volta. E quer saber? Foda-se, estou nessa até o fim.




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Carta II

De: Bernardo Biagioni
Para: Raulzito

Tudo bem, eu explico porque eu convidei aqueles dois ‘canibais fumadores de erva’ para a viagem. Ontem nós saímos de madrugada para dar uns tiros. Pegamos uma arma de paintball enferrujada e fomos para um trilho de trem abandonado que fica perto lá de casa. A brincadeira era a seguinte: empurrávamos alguém para frente e começávamos a disparar sem dó nem piedade. Tudo estava correndo bem, até que um dos nossos perdeu o controle e disparou contra a janela de um prédio. Tivemos que ficar abaixados na grama até que a polícia desistisse da detenção. Enquanto os cães farejadores faziam seu serviço sujo, a gente conversava sobre extraterrestres, amigos abduzidos e seres geneticamente modificados.

Vou te confessar que o Antônio estava trincando. À medida que as histórias iam se desenrolando, o sujeito seguia no exercício silencioso de comprimir todos os músculos do corpo, uma nítida reação de ansiedade, pânico e inquietação. Depois, quando já estávamos em um posto de gasolina, ele veio caminhando baixinho na minha direção e perguntou: “Cara, aqueles casos eram de verdade?”. Raul, veja bem: Eu sentia correr uma pontada de fascinação por cada extremidade daquele corpo – O Antônio estava se revirando na vontade de encontrar um extraterrestre e desencadear de vez o misticismo encrespado em cada poro de seu cérebro. Então, sem perder o controle, coloquei minha mão direita sobre seu ombro e exclamei com convicção: “Venha com a gente para o Carnaval. Você vai encontrar todas as respostas que desnorteiam os seus pensamentos. Todas as suas dúvidas serão preenchidas com certezas absolutas e os seus devaneios mais íntimos serão esclarecidos um a um”.

Quanto ao Flávio, o outro ‘canibal de erva’, ele entrou nessa por forças surpreendentes do cosmos. Estávamos em algum bar conversando sobre a Sensação de ser Brasileiro, Mitos do Carnaval e descobrir uma Força interior e acabei fazendo o convite. Acho que todos nós estivemos remando no mesmo barco há algum tempo sem saber. Essa Viagem será uma chance de mergulharmos no limite da nossa Consciência para tragar e beber os distúrbios inverossímeis da nossa mente. Lembro quando li Aldous Huxley pela primeira vez: “Se as portas da percepção estiverem abertas, você verá o mundo como ele realmente é: infinito.” É isso, entende?

Bom, agora nos resta brindar a infinitude da nossa alma e encarar de cabeça as próximas vibrações. A hora está chegando e, quando for o momento certo, poderemos gozar a essência de todos os sentidos da nossa Alma e sentir, pela primeira vez, o Poder de ser Brasileiro.

Bon Voyage,

Bernardo Biagioni

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Carnaval/Carta I/Respota



Resposta de Raulzito

Para: Bernardo Biaigoni (Carnaval/Cartas I)


Maldita memória essa sua heim! Ainda bem que estou aqui cuidando do resto, se não, bem, se não seria melhor nem imaginar. Eu te avisei! Deixei até um bilhetinho na maçaneta da porta. "TRAGA CAMELOS". Ninguém deve subestimar a utilidade de um animal desse porte. Caso não saiba, camelos podem ficar meses sem beber água. Dizem por aí também que eles nunca se cansam. E caso ficarmos perdidos (posso ver que vc, como eu, já esta contando com isso, ainda bem!) podemos nos alimentar da carne deles.


Lembre-se que nesta terra tudo pode acontecer. Acordar com Carmem Miranda não é surpresa para ninguém. Tome cuidado. E não converse com estranhos, se não pode acabar igual ao gringo que conhecemos no carnaval passado. Ele vinha com aquela conversa cheia de sotaque “Oba! MulHHer pêlada! Brêjah! Samba! Mulata Shakin!” e tudo mais. E no final das contas, queria o mesmo que todos os outros sempre querem: comprar sungas amarelas e montar uma banda de samba. Banda de SAMBA! Se isso não for pecado, não sei mais o que é. Imagina se chegam pro Cartola e perguntam “Ae Cartola, quer montar uma banda de samba?”. Tiro na nuca, com certeza.


Da última vez que o vi, tinha montada a tal banda de samba, Hi-Fly Orchestra, que na verdade parecia mais uma banda de mambo-jazz tocando algumas músicas brasileiras e Jimi Hendrix. Pois é, incluiram Jimi Hendrix na parada. Realmente, ele não tinha entendido o verdadeiro swing das coisas por aqui, ou toda aquela birita acabou por deixa-lo louco. Quem em santa consciência começa tocando Carioquinha, depois, mantendo um ritmo parecido, pula para Crosstown Traffic, do papai Hendrix e ainda tem a cara de pau de chamar a bela voz de Miriam Aida para cantar Chove Chuva do Jorge Bem? Tudo isso em um mesmo álbum, chamado Mambo Atômico. Sim, sim, como eu disse, tem mambo nessa bagunça. A música que da título ao projeto é um mambo, caribenho mesmo, extremamente bem arranjado, muito bonito. Eita gringo loco esse viu.


Estarei acampado em frente a minha casa te esperando.

Bye Bye.


Raulzito

*Não acredito que aqueles dois canibais fumadores de erva vão nos acompanhar. A responsabilidade é toda.


Destinatário: Tempos Estranhos


Download Hi-Fly Orchestra - Mambo Atômico




01. Carioquinha
02. Polonesa feat. Miriam Aida
03. Crosstown Traffic
04. Mrs. Shing-A-Ling
05. Hi-Fly Stomp
06. Mambo Atomico
07. Afro-Boo
08. Chove Chuva feat. Miriam Aida
09. Gettin' Down
10. The New B!
11. SP Samba

Vídeo da Hi-Fly Orchestra


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Carta I

De: Bernardo Biagioni
Para: Raul Sampaio

Pode ficar tranquilo que já estou preparado para o Carnaval. Acordei hoje cedo e montei os dispositivos que manterão os morcegos afastados do carro. Vamos precisar de água. Muita água. Receio que vamos nos perder pelo caminho, mas também tenho estudado alguns mapas. Acho que renderá uma boa história, se você quer saber. De repente uma reportagem que poderá mudar a vida das pessoas. Coloquei na mochila alguns livros que podem lhe interessar, inclusive o Sofrimentos do Jovem Werther, de Goethe. Vamos precisar de ajuda profissional para conversar com aquelas meninas do campo. Ah! Não esqueça da barraca. Tentei conversar na pousada hoje e me falaram que o estabelecimento havia sido alagado na última madrugada. O mais estranho é que a última vez que choveu naquela região foi em Junho do ano passado. De qualquer forma, o sujeito que me atendeu lá do outro lado não parecia estar mentindo. Eu sentia correr pela fiação o pânico que regojizava sua espinha vertebral.

Hoje cedo, passei no supermercado e garanti alguns alimentos - Estão falando que até o final da semana não haverá muito o que comer por aqui.
Já separei uma quantidade exuberante de pilhas. Serão necessárias muitas horas de energia. A sua fantasia de dançarino também já está empacotada. Não encontrei o chapéu de marinheiro, mas vou procurar amanhã cedinho. Fora isso também tem os CDs. Pensei em deixar alguns discos aqui, acho que não precisaremos de nada muito pesado nos próximos dias. Selecionei uma grande quantidade de músicas caribenhas, havaianas e cubanas. Também vou levar Jorge Ben, Bezerra da Silva, Adoniran Barbosa e Gotan Project - As garotas podem ficar a fim de dançar um tango mais acelerado quando a noite cair. O violão vai ficar. Assim que chegarmos, podemos invadir uma loja de instrumentos e recolher tudo que for necessário. É Carnaval, o dono não vai nem notar. Tem ainda as vodkas, as cervejas, a tequila e o Rum. Pensei em misturar tudo e levar uma garrafa só, mas uma atendente de telemarketing me aconselhou que não seria uma boa idéia. Bom, como eu disse no começo, já estou preparado para o Carnaval. Não ha com o que se preocupar - Logo,logo estaremos sentados no carro e poderemos sair acelerando por aí.

Ciao,

Bernardo Biagioni



sábado, 7 de fevereiro de 2009

Buddy Guy - Danmmm, He stil got the BLUES!




Beacon Theatre, Nova York. Os Rolling Stones (e todos seus adjetivos colossais e infinitos) gravavam o filme/show Shine a Light.


Mick Jagger - “Agora nos vamos tocar uma canção escrita por... Na verdade, não sei se ela foi escrita por Muddy Waters, mas a primeira vez que a ouvi, era Muddy Waters que tocava. Chama-se Champagne and Reefers. E Buddy Guy vai nos ajudar”.


*Mesmo depois de décadas, os deuses do rock ainda precisam do blues para continuar respirando.


25 de setembro de 1957, à noite. George Guy chega a Chicago. A roupa que usava e o violão eram seus pertences. O inverno estava chegando e ele não tinha lugar para ficar. Teria que dormir na rua. Para falar a verdade, nas primeiras impressões, à terra sagrada do Blues não estava parecendo nada promissora para aquele moleque de 21 anos, que havia agüentado, sem dormir, mais de dez horas em um ônibus apertado e sujo. O pequeno vilarejo sem eletricidade, onde havia nascido, em algum lugar de Louisiana, parecia muito mais acolhedor naquele momento.


Três dias sem comer. Ou será que haviam sido quatro? Não tinha como saber. Chicago se transformara no inferno. Toda aquela rapidez. Todo aquele barulho. Toda aquela gente. “Foda-se Chicago. Vou voltar para Louisiana”. Nem isso ele podia fazer. Não tinha sequer alguns míseros centavos para usar o telefone e pedir que sua mãe lhe enviasse o dinheiro da passagem. Então, resolveu pedir dinheiro a um homem que passava na rua.

“Você sabe tocar o Blues?”.

“Com toda a certeza, eu sei tocar o Blues”.

“Então, toque uma música”.

“Só se você me pagar um hambúrguer”.

“Oras, se eu te der um hambúrguer, você ira perder o incentivo de tocar, assim que terminar de come-lo”.


Guy não ganhou o hambúrguer, mas aceitou uma taça de vinho. Ahhh! Os primeiros goles! Quase o derrubaram. Ele agüentou firme e de repente começou a sentir. Sentir o Blues, sentir o MOTHERFUCKER BLUES. Seu corpo e o violão pareciam um só, na verdade, agora, eles eram um só. O homem, impressionado com o som que aquele garoto criava, soltou a clássica frase das noites de Chicago, “Motherfucker you can play the Blues!” e tratou de leva-lo para o 708 Club, onde Otis Rush tocava naquela noite. Chegando ao blues-bar-joint o misterioso companheiro de Guy chamou Rush e disse “Hey, esse garoto vai te deixar maluco”. Sem demoras, o músico da noite mandou o recém-chegado à Chicago subir no palco.


Ele subiu e tocou como um homem que não comia por três dias. Ele sentiu o Blues. Ele era o Blues. Muddy Waters foi acordado no meio da noite e ao ouvir o som pelo telefone, saiu correndo de pijamas para local. O 708 Club estava pegando fogo. A platéia, influenciada pela música e pela bebida não parava de jogar dinheiro para o garoto. A partir desse momento, George Guy ia dando lugar a um dos maiores representes do Chicago Blues de todos os tempos, Buddy Guy.


No final da noite, quando perguntaram-no sobre o que faria com o dinheiro que ganhara, sua resposta foi simples “Vou comprar um hambúrguer”.


Mais de 50 anos depois de sua primeira apresentação em Chicago e sendo o ultimo grande nome vivo (B.B. King começou em Memphis) daquela cena, o bluesman não deixa de representar seus velhos amigos – Muddy Waters, Little Walter, Howling Wolf – de maneira sincera e grandiosa. Continua a modernizar o Blues, sem deixar que sua essência se perca. Prova maior disso é o lançamento de Skin Deep em 2008, seu primeiro trabalho totalmente de composições próprias e inéditas. O título desse álbum veste-o perfeitamente. Buddy Guy vai lá no fundo, vasculha por tudo quanto é canto, arranca um pouquinho daquilo ali, morde mais um tanto daquilo lá, sangra, cospe e sorri, sempre acompanhado de sua guitarra de bolinhas brancas. Um blues denso, imprevisível, emocionante e ainda fácil de se ouvir. O Blues de Chicago, nem tão puro quanto nos anos 60, mas ainda sim, o Blues de Chicago.


Nesse projeto, o que mais me impressiona é a intensidade instrumental das canções, principalmente em Show Me The Money. Sua introdução é tão magnífica, que fiquei aqui, tentando descreve-la e não consegui. A única coisa que posso falar é que seu ápice acontece quando uma poderosa voz feminina canta maravilhosamente “SHOWWWWWW ME THE MONEYYYYY” e a partir daí, a deliciosa e poderosa música começa.


É pela música Every Time I Sing The Blues, na qual Eric Clapton participa, que sabemos porque ele é considerado como Elvis para o bluesman inglês. E no final das contas, através dos riffs bem colocados por todo o álbum, podemos entender o porque de Buddy inspirar tanto Jimmy Hendrix.


Buddy Guy! Uma espécie em extinção. Ao lado de B.B. King, representa o ultimo suspiro do old-and-good-Blues-times.


Download Buddy Guy - Skin Deep (2008)



01. Best Damn Fool (feat. The Memphis Horns/Willie Mitchell)
02. Too Many Tears (feat. Derek Trucks/Susan Tedeschi)
03. Lyin' Like A Dog
04. Show Me The Money
05. Everytime I Sing The Blues (feat. Eric Clapton)
06. Out In The Woods (feat. Robert Randolph)
07. Hammer And A Nail
08. That's My Home (feat. Robert Randloph)
09. Skin Deep (feat. Derek Trucks)
10. Who's Gonna Fill Those Shoes (feat. Quinn Sullivan)
11. Smell The Funk
12. I Found Happiness



Buddy Guy tocando Sweet Home Chicago

Buddy Guy e B.B. King tocando I Can´t You Baby

Buddy Guy tocando Voodoo Chile



terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

The Boogoos - Se não fossem alemães, até valeria acreditar...



Metaleiros sanguinários – dos que cortam cabeças de carneiros no meio do show, bebem de seu sangue e gritam “ahhhhhhhhhhh metal até a morte” - estavam no meu encalço. Aposto que queriam o minha carne. Sim, isso mesmo, meu sangue fazia parte de seus planos. Fugir era a única opção. Retalhar tais ameaças só funcionaria se eu fosse corintiano, flamenguista, ou um hooligan. Sou cruzeirense...

Resolvi me exilar na África. Terra de Felá Kuti, nigeriano danado, um dos meus ídolos, o Miles Davis por aquelas bandas, criador do Afrobeat, juntou funk e jazz, amarrando tudo com fitas sonoras, trompetes e guitarras africanas. Continente de onde a música ocidental tirou sua essência. E o ultimo lugar onde eu poderia encontrar um headbanger, ou vice-versa.

Enquanto perambulava pela Cidade do Cabo, com o corpo encharcado de suor, vestindo um macacão de estampa de oncinha (guitarrista do Van Halen no clipe de Jump), que servia para camuflagem na selva, algo inusitado aconteceu. 13 alemães surgiram na minha frente. Estavam cheios de instrumentos e tinham caras de turistas. “SARAVÁ, isso é obra do cão” pensei a principio, mas logo percebi que estava enganado. A atmosfera, antes extremamente desagradável e quente, se tornou florida e festeira. O swing dominou todo o lugar. Ninguém era de ninguém. Um Afrobeat moderníssimo começou a ser tocado pelos germanos, promovendo algo mais ou menos como uma explosão de cores e de notas musicais variadas, que percorriam o corpo da charmosa voz feminina. Esta por sua vez, entoava, de uma forma meio largada e bêbada, uma canção chamada Theme De Yoyo. Em alguns momentos parecia que os metais estavam organizados para soarem desajustados, o que ia arrastando a harmonia da melodia para um buraco totalmente desarmônico. Mas sempre que ela estava ameaçada de cair naquele posso de perdição, tudo voltava aos seus devidos lugares e a música continuava impecável. Isso sim era uma Big Band caótica, e aquele bando de branquelos carnavalescos na minha frente, não faziam a mínima questão de esconder esse fato.

....

Acordei sem saber por quanto tempo estive incapacitado de raciocinar. Se eu ainda tinha pernas, mal podia senti-las. Haviam raspado meu cabelo e logo logo iria descobrir a palavra “The Boogoos” tatuada na minhas costas. Meu mamilo direito sangrava, culpa de um piercing mal colocado. Por mais perdido que estava, uma música ainda ressoava claramente na minha cabeça. The Journey (Ghana '74) foi o ultimo espetáculo sonoro que os europeus deram antes de eu apagar. Percussão presente a todo o momento e muito bem marcada. Bateria apresentando potentes explosões. Teclado dançante no plano de fundo. Flauta que vez ou outra aparecia só para nos espantar mais ainda. Os metais mantinham o corpo enxuto da canção, misturando-se lindamente. E uma voz, dessa vez masculina, muito semelhante às de cantores de jazz, mas que parecia também ter pego algo emprestado de James Brown comandava aquela balada africana, feita por europeus e curtida por um brasileiro.

Pensei em marcar uma cirurgia para retirar a tatuagem das minhas costas. Desisti. Um nativo mudo, amigo meu, explicou-me que The Boogoos era o nome daqueles impiedosos alemães.



MySpace The Boogoos


Download Singles Theme De Yoyo e The Journey (Ghana 74)

*Créditos ao ótimo Blog
Lets Go and Get It


domingo, 1 de fevereiro de 2009

Calçados Enxutos / Bitches Brew de Miles Davis / Inquietação


Rapazes, não se esqueceçam, mantenham os sapatos sempre enxutos...


Sapatos são itens indispensáveis para atrair mulheres interessantes. Mulheres que podem mudar nossas vidas. Miles Davis conhece bem essa história. Encontrou Betty Mabry na balada, apaixonou-se, ficou amigo de Jimi Hendrix e Sly Stone, e após fazer amor como um louco com sua recente paixão, pegou seu trompete e saiu tocando-o pela noite, completamente chapado de ácido, fantasiando ser um deus dourado, que tinha uma missão a completar. “Vou fuder com tudo.” pensou. “Que se dane as regras e os parâmetros musicais, dessacralizar o jazz, misturando-o com o rock and roll, vai ser lindo. Vai ser lindamente psicodélico. Yeahhh. Soul Music na cabeça, rapaz.”. Os sapatos o ajudaram no seguinte aspecto: a própria Betty, nem sabia quem era aquele homem quando o conheceu, mas seus calçados a deixaram louquinha.


A partir dai, Miles obrigou todos de seu quinteto a ouvirem Grateful Dead e Jefferson Airplane antes de dormir e uma vez por semana trancavam-se em um estúdio, ouvindo sons psicodélicos, sendo apenas permitidos de se comunicarem com seus próprios instrumentos.


Para solidificar o contato com a essência do rock and roll psicodélico e da soul music, o trompetista complementou seu quinteto chamando Herbie Hancock e Joe Zawinul com o intuito de fazer com que eles tirassem dos teclados sons que provavelmente não exisitam. Shorter ficou responsável pelos sopros no sax soprano e o cientista John McLaughlin encontrou as formulas brilhantes e pouco lógicas, para incorporar a guitarra, de uma maneira esotérica, ao jazz. Assim, o estilo Jazz-rock Fusion começou a tomar forma e Davis ficou grávido deu seu filho mais esquizofrênico, Bitches Brew.


A paixão entre Miles e Betty era maior que a da Cinderela e seu príncipe, mas não durou para sempre. Culpa de um trompete anarquista chamado Dirty Trump Jr. Jr era um safado, mas soava melhor que as cornetas dos querubins mais eruditos. Dizem que Louis armstrong estava bêbado e o encontrou boiando em um rio sujo e podre de New Orleans. Ao tentar toca-lo, entrou em transe, acordando apenas uma semana depois. Por várias décadas ninguém conseguiu domar aquele trompete, até que ele caiu nas mãos de Miles e não saiu por muito tempo. Durante a gravação de Bitches Brew, Jr levava seu dono a viagens pelo espaço e tempo, o que acabou comprometendo a relação entre ele e sua esposa, pois instrumentista e instrumento ficavam desaparecidos por longos períodos.


Bem no dia do aniversário de Betty, Dirty Trump fez com que Miles e seus companheiros de banda se encontrassem com os faraós do Egito Antigo. Sob toda a aridez do deserto e a hegemonia magnifica das pirâmides, Pharaoh's Dance foi composta. O grupo só reapareceu quase um mês depois. O maldito trompete também encorajou Davis a cometer adultério. Ele foi apresentado a uma fogosa prostituta-saxofônista espanhola e para desvendar os segredos da música hispânica, manteve relações sexuais com ela durante três meses. O rala-rala só era deixado de lado, quando deciam ao decadente cabaré da esquina e, completamente nús, animavam o local com belas múscas. Todas improvisadas. A fabulosa Spanish Key foi resultado dessa experiência. Betty, infelizmente, não entendeu que seu marido fez tudo isso em nome da arte. Em nome da mais pura arte.


Entender como Bitches Brew foi composto é impossível. A maioria dos lunáticos acontecimentos pelos quais os músicos envolvidos na produção do álbum passaram, são uma mistura confusa entre a realidade e as mais divergentes fantasias. Ninguém lembra muito bem de nada. E é melhor que as coisas permaneçam assim.



Disco 1:

1 - Pharaoh's Dance

2 - Bitches Brew (melhor faixa)


Disco 2:

1 - Spanish Key

2 - John McLaughlin

3 - Miles Runs the Voodoo Down

4 - Sanctuary

5 - Feio - (bonus track)


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(Se o link para download não estiver funcionando, me avise que consertarei)


- Entrevista com Miles Davis

- Miles Davis tocando Bitches Brew (apenas uma parte)